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Sebring – 1966

• Por Alfa Romeo
Sebring – 1966

Nota: este artigo foi originalmente publicado pelo autor no Boletim Informativo do Alfa Romeo Club do Brasil Ano I, nº 2, abril de 1990. Por isso há uma referência de época aos 25 anos do campeonato Trans-Am. Resguardados os trechos originais, a presente versão contém a adição de novos dados e um compêndio fotográfico sobre o tema. Além disso há um adendo “Quem foi Jochen Rindt?” com um breve biografia do principal protagonista dos eventos ocorridos no autódromo de Sebring-Florida/EUA em março de 1966.

Recentemente, lendo uma conhecida revista especializada norte-americana, encontrei na seção esportiva uma longa reportagem sobre os vinte e cinco anos da instituição de um dos mais importantes campeonatos do automobilismo: o “SCC – Sport Cars Club of America Trans-American Championship “ ou simplesmente Trans-Am.

As provas da Trans-Am constituem hoje o mais sensacional campeonato para carros esportivos realizado na América. Sua importância pode ser comparada com a dos campeonatos europeus, se bem que na Trans-Am a preparação é maior, os carros de turismo misturam-se aos de esporte e os carros europeus misturam-se aos americanos. No seu início a trans-am tinha duas categorias básicas, uma até 2 litros e outra acima de 2 litros e por isso mesmo as baterias, que envolviam todos os carros, eram geralmente dominadas pelos mais potentes.

Na referida revista, já ao fim da reportagem, encontrei com surpresa a foto de um Alfa GTA com a legenda: “….Apesar de ter-se tornado um domínio dos americanos, curiosamente a primeira prova Trans-Am foi vencida por um piloto europeu com um Alfa…”

Com a ajuda de literatura da época tratei logo de resgatar essa história. Volte no tempo comigo:

Estamos no Autódromo de Sebring  (Flórida- EUA). O dia é 25 de março de 1966. São as 4 horas de Sebring – 1ª Etapa do 1º Campeonato Trans-Am.

A corrida é uma preliminar das 12hs de Sebring válida pelo campeonato mundial de marcas da FIA que ia assistir o confronto Ferrari x Ford em que os Ferraris da Scuderia e de equipes particulares iam se defrontar com os Fords GT 40 e MK II da própria Ford, da Shelby American e equipes particulares, com a participação  dos avançados e velozes protótipos Chaparral- Chevrolet na disputa.

Para as 4hs estavam previstas duas categorias. Na categoria acima de 2 litros as forças eram as “três grandes americanas”. A Ford com três Mustangs sendo um para o lendário piloto texano A.J. Foyt, vencedor de Indianápolis e a maior estrela da prova. A Chrysler com um Dodge Dart e três Plymouths Barracuda (carro “irmão” do Dart) na mão de experientes pilotos americanos entre os quais o famoso Bob Tullius e a GM representada por dois Chevrolet Corvair.

Na categoria abaixo de 2 litros as forças eram os quatro BMW 1.800 Ti, os dois Ford-Cortina Lotus oficiais da Alan Mann Racing (braço esportivo da Ford inglesa) para John Withmore e Peter Procter, vários Mini Cooper sendo dois deles inscrições oficiais da BMC, um com o famoso Paddy Hopkirk em dupla com Peter Manton e  outro com Roger West e uma grande quantidade de Volvos e Saabs muito populares entre os pilotos de turismo americanos.

A Autodelta inscreveu duas GTAs (1.6 ou mais exatamente 1.570cc) para De Adamich/Zecolli e Rindt/Businello.

Participariam também outras 4 GTAs  nas mãos de pilotos locais, a saber, Paul Richards, Howard Hanna, Monty Winkler e a dupla Kwech/Andrey.

Ou seja, todos achavam que os carros americanos acima de 2 litros iriam “sobrar” e fariam uma “corrida à parte”, deixando os europeus, mais numerosos,  se engalfinhar pela vitória na categoria inferior.

Sobre a presença oficial da Autodelta se podem vislumbrar três objetivos:  o primeiro de propaganda da Alfa no mercado americano para venda de carros de passeio ao estilo “ganhar no domingo para vender na segunda”, sempre lembrando que nesse tempo a Alfa tinha razoável presença no mercado americano (que depois deixou de ter por muitos anos).

O segundo objetivo seria dar um pouco de tarimba internacional para a equipe da Autodelta que, no ano seguinte, voltaria a Sebring para participar da prova principal, as 12hs, com os protótipos P-33.

O terceiro motivo (não-declarado) era vender as GTAs para pilotos americanos. A Alfa fez saber entre seus concessionários e pilotos-clientes que não queria voltar com os carros para a Itália. Embora já houvessem GTAs nas mãos de pilotos locais, isso criou um certo alvoroço entre os alfistas americanos que sabiam que os carros vinham com a melhor preparação da Autodelta e que vinham para tentar ganhar na categoria até 2 litros. Só não sabiam o que iria acontecer…..

Quanto à presença de Rindt, que faria mais algumas provas ao longo do ano com a Autodelta na Europa, imagina-se um interesse recíproco. Do piloto que já tinha afinidade com a marca pois correra com Giulietta no início de carreira (ver apêndice abaixo “Quem foi Jochen Rindt?) e também pelo fato que nos anos sessenta o campeonato de F-1 era muito curto sendo normal os pilotos de F-1 competirem em outras categorias inclusive F-2, Protótipos e Turismo para completar seus ganhos.

Também é necessário dizer que a principal oposição da Alfa na Europa era a Ford com os Lotus Cortina.  Os Cortinas embora maiores que os Alfas eram muito leves e a versão de competição tinha o chassis preparado pela Lotus e o motor era “afinado” pela BRM (ou seja, duas equipes de F-1 da época).

Era muito difícil vencer os Cortinas e a Alfa, embora competitiva nas temporadas de 64 e início de 65 com as Giulias Ti Super, só conseguiu se bater de igual para igual com a Ford a partir do lançamento da GTA

Quando a Autodelta alinhou as GTA em meados de 65 viu que o problema não era só a qualidade dos carros, mas o gabarito dos pilotos que a Ford inscrevia, como os campeões de F-1 Jim Clark, Graham Hill, o futuro campeão Jackie Stewart, sem falar nos especialistas ingleses em carros de turismo como Jack Sears e o lendário Sir John Withmore. Este último, o famoso aristocrata inglês, era tão bom que andava nos mesmos tempos de Clark e após ganhar tudo com carros de turismo preferiu abandonar o esporte porque não gostava de pilotar os monopostos de fórmula.

Então a Alfa percebeu o “calibre” da concorrência e viu que convidar um piloto de F-1 como Rindt (uma estrela ascendente da F-1) fazia todo o sentido

Conforme dito acima, Rindt estava inscrito com a GTA da Autodelta em dupla com o piloto-chefe de testes da Alfa, Roberto Businello.

Businello capotou a GTA nos treinos e não participou da prova fazendo com que Rindt ficasse incumbido de pilotar sozinho as quatro horas da prova.

Após a capotagem, a GTA embora perfeita mecanicamente, ficou cheia de amassados e remendos, causando mais espanto aos americanos e provando a “valentia” dos carros italianos porque a GTA era incrivelmente rápida nas mãos de Rindt

A GTA de Rindt largou com os 9 carros americanos à frente (Mustangs, Dodges, Plymouths e Corvairs).

Mas assim que se estabeleceu um pelotão de ponta só três carros americanos permaneceram à frente de Rindt e a corrida foi inicialmente liderada pelo Mustang de A.J. Foyt,  que era o “astro especialmente convidado” da prova.

Foyt, ainda jovem, já era, porém, um vencedor de Indianápolis e no final de sua longa carreira contabilizaria 4 vitórias nas 500 milhas de Indianápolis, 7 campeonatos USAC, vitórias em Stock Cars, vitória nas 24 hs de Le Mans sendo um dos mais completos e ecléticos pilotos americanos de todos os tempos.

Com Foyt na ponta, os quatro líderes seguiam no mesmo ritmo e embora fosse claro que a pequena GTA de Rindt não poderia passar os carros à frente, esses também não conseguiriam se desvencilhar nem abrir uma vantagem sobre Rindt.

Foyt liderou as primeiras 32 voltas, ou seja, praticamente metade da prova, mas teve que abandonar com junta de cabeçote queimada no Mustang e o maior adversário de Rindt passou a ser o Dodge Dart de Bob Tullius/Tony Adamowicz que herdou a liderança.

Deveria haver uma única parada para reabastecimento e a troca de pilotos (no caso dos carros que estavam inscritos para dupla de pilotos).

O Dodge Dart líder teve que fazer uma parada adicional deixando a ponta para Rindt.

Há certa controvérsia sobre a melhor volta da prova, que algumas fontes atribuem ao Dart de Tullius/Adamowicz com 3`30”6, outras fontes ao Mustang de Dick Thompson e outras ao GTA de Rindt.

Rindt se instalou na liderança girando com consistência e ótimos tempos, ficando óbvio, para assombro dos americanos que a vitória iria ser do pequeno carro italiano

Os outros oponentes europeus não conseguiram se colocar à altura dessa disputa

Franco Lini, o mais importante jornalista de corridas italiano e posteriormente chefe de equipe da Ferrari na F-1 por algum tempo, assim descreveu a prova:

(trechos traduzidos estão intercalados com os trechos do original em italiano)

“ Gli spettatori erano sbalorditi. Erano venuti da tutte le parti d`America fin giu in basso, in Florida, per le “12 Ore di Sebring”, precedute dalle “4 Ore” riservati alle macchine da Turismo…”

… Tinham vindo para assistir o triunfo americano que para eles estava claro na prova das 4 horas onde os europeus Alfa Romeo, Ford Lotus (Cortina) e BMW deveriam se misturar com os enormes carros da Ford, Chrysler e General Motors. Talvez tivessem qualquer dúvida sobre o sucesso na prova das 12 horas onde os protótipos Ferrari eram a diferença, mas na prova de turismo não haviam dúvidas…

E continua:  “ …. invece erano li, a bocca aperta, increduli: uma macchina rossa, uma piccola macchina rossa italiana stava batendo clamorosamente non soltanto le Ford Cortina, non soltanto le BMW di cilindrata superiore, ma le Ford, le Dodge, le Plymouth di cilindrata tripla…”

Rindt completou 67 voltas e venceu com uma volta de vantagem sobre o Dodge Dart de Tullius / Adamowicz de 4.481cc.

A outra GTA de De Adamich/Zecolli se chocou contra um dos cones de borracha que demarcava o circuito (Sebring era um aeroporto e base militar da 2ª Guerra) e perdeu algum tempo nos boxes, mesmo assim chegou em terceiro.  As GTAs particulares de Paul Richard e a de Kwech/Andrey chegaram em  quarto e quinto, deixando os Plymouths Barracuda de Scott Harvey e Rainville/Jennings em sexto e sétimo, com a GTA restante (Howard Hanna) em oitavo. A outra GTA que largou com Monty Winkler completou apenas uma volta.

Ou seja, uma massacrante vitória da Alfa. (primeiro, terceiro, quarto, quinto e oitavo, intercalados apenas por carros da categoria acima de dois litros entre os 44 carros inscritos).

O nome Alfa Romeo era uma lenda do passado para os jovens americanos dos anos 60 e a prova de Sebring em 1966 mostrou que a lenda estava viva e porque na Itália se diz que “Um carro é um carro e um Alfa é um Alfa”

Rindt ganhou US$ 800 pela vitória (outros tempos).

Conforme planejado as duas GTAs da Autodelta foram vendidas após a prova e marca não fez mais nenhuma aparição ”oficial” na Trans-Am, mas os pilotos particulares de GTA venceram o campeonato de 66 para Alfa Romeo com mais quatro vitórias na categoria até 2 litros.

Horst Kwech e Gaston “Gus” Andrey  obtiveram 3 das 4 vitórias na categoria até 2 litros e Kwech individualmente seria campeão se houvesse um campeonato de pilotos na Trans-Am da época

A única vitória “na geral” dos carros abaixo de 2 litros foi a de Rindt e naturalmente depois da “lição” de Sebring as equipes americanas não “bobearam” mais com seus V-8. Mas na categoria abaixo dos 2 litros a Alfa ainda seria campeã em anos seguintes, mesmo contra os Porsches 911 que viriam a ser os maiores adversários das GTAs na Trans-Am.

Agora, após relembrar essa epopéia, volto para a revista americana, revejo a foto e não posso deixar de esboçar um sorriso quando releio a legenda que diz: “.. curiosamente a primeira prova Trans Am foi vencida por um piloto europeu com um Alfa…”

Quem foi Jochen Rindt?

Jochen Karl Rindt nasceu na Alemanha em 18 de abril de 1942 em plena segunda guerra mundial e ficou órfão pouco tempo depois, sendo criado por seus avós maternos em Graz, Austria, em razão do que tinha nacionalidade austríaca.

No entanto, era o herdeiro da Klein-Rindt GMBH, uma tradicional e centenária indústria alemã de condimentos e especiarias que foi administrada por um colegiado até que Rindt chegasse à maioridade.

Rindt desde cedo se interessou por esportes de velocidade, principalmente o ski, e quando jovem foi a um intercâmbio na Inglaterra para aprender a língua morando próximo ao célebre autódromo de Goodwood onde tomou contato com as corridas de automóveis.

Em 1960 aos 18 anos recebeu da Klein-Rindt um Volkswagen com motorista particular para seu transporte pessoal. O motorista foi rapidamente dispensado e Rindt usou o fusca para seus “rachas” contra amigos, entre os quais Helmut Marko que viria a ser piloto de F-1 e protótipos e hoje chefe da Red Bull F-1.

O fusca foi rapidamente trocado por um pequeno Simca Montlehry que Rindt logo espatifou contra uma máquina limpa-neve. Um novo Simca foi providenciado, enquanto o avô de Rindt, um conhecido advogado austríaco, o livrava de problemas com as autoridades em consequência das “aventuras” automobilísticas do neto.

Com o Simca, Rindt começou a participar de alguns eventos menores na Austria em 1961, principalmente subidas de montanha, onde já foi se destacando pelo talento e arrojo.

No ano seguinte  a avó de Rindt o presenteia  (“por encomenda”) com uma Giulietta Ti e aí começa a ligação de Rindt com a Alfa Romeo.

Devidamente preparada pela Conrero, a Giulietta se torna o carro de corridas de Rindt para seus primeiros sucessos mais relevantes em 1962. Ele  vence sua classe em 8 vezes sendo algumas provas de turismo e outras em subidas de montanha na Austria e na Itália.

No ano seguinte, com os recursos próprios que passa a receber da empresa em função da maioridade,  Rindt providencia a compra de um monoposto Cooper formula júnior de segunda mão com o qual obtém algumas vitórias e classificações em provas européias.

Os monopostos mais rápidos e as corridas curtas de “pé-na–tábua” o tempo todo atraem o jovem Rindt e no final do ano de 1963 ele vai a Londres “fazer compras” para a próxima temporada.

Ali conhece Frank Williams e outros jovens pilotos entre os quais seu futuro grande amigo Piers Courage e, entusiasmado, encomenda um novo Brabham F-2 em janeiro de 1964.

Em maio de 1964 acontecem os eventos que iriam tornar  Rindt uma lenda no mundo automobilístico e carimbar seu passaporte para uma carreira internacional de primeiro nível.

Após duas corridas de aclimatação em seu novo F-2, ele vai estrear em pistas inglesas no circuito de Mallory Park em uma prova onde estão os titulares da Lotus entre os quais o campeão reinante da F-1, Jim Clark.

Rindt, assombrosamente, faz a pole position à frente de Clark e Dennis Hulme e na corrida chega em terceiro atrás apenas de Clark e Arundell (colega de Clark na Lotus).

No dia seguinte, durante o  mesmo fim de semana, ele vai ao circuito de Crystal Palace para uma prova de F-2 em três baterias, sendo uma para pilotos graduados, uma para iniciantes e a última com os melhores classificados das duas. Rindt naturalmente vence a dos iniciantes sobre dois jovens pilotos talentosos Alan Rees e Kurt Ahrens e vai para a final onde seu maior adversário será Graham Hill (então ex-campeão mundial de F-1 de 1962). Sem constrangimentos Rindt ataca e passa Hill e o acaba deixando o londrino em um distante segundo lugar depois que Hill passa a enfrentar problemas mecânicos no final da prova.

A imprensa inglesa vem abaixo: “Um desconhecido derrota Graham Hill”.

Rindt segue na F-2 naquela temporada, com um nível mais modesto de sucesso, mas dá os seus primeiros passos na F-1 com a equipe particular de Rob Walker pela qual participa com um Brabham-BRM do GP da Austria de F-1.

Sem poder garantir um contrato, Rob Walker encaminha Rindt para a equipe oficial da Cooper onde com o apoio da BP (British Petroleum) um acordo é firmado e Rindt se torna piloto titular de uma equipe de F-1.

Mas a Cooper, a famosa campeã de 1959 e 1960 com os primeiros monopostos de motor traseiro (central) já não estava nos seus melhores dias.

Após uma temporada anônima em 65 com o Cooper-Climax, Rindt passa a piloto principal em 1966, com a saída de Bruce Mclaren que vai fundar sua equipe própria.

Em 66 a formula 1 aumenta a capacidade dos motores de 1,5 litros para 3 litros e a Cooper escolhe os motores V-12 Maserati de 3 litros. Rindt faz uma temporada razoável ficando em terceiro no campeonato e quase ganha o GP da Bélgica em SPA debaixo de uma chuva torrencial (cenas desse GP podem ser vistas no famoso filme “Grand Prix”).

Em 67, porém, a temporada é marcada por abandonos e o novo Cooper-Maserati T-86, com chassi de alumínio e magnésio e uma versão especial do motor Maserati V-12 com 3 velas por cilindro se revela um carro frágil e problemático.

Enquanto o sucesso não lhe sorri na F-1, Rindt consolida sua fama em outras categorias.

Após algumas corridas com o Ferrari 250 LM em 1964, no ano seguinte (1965) ele é novamente convidado para participar das 24 hs de Le Mans no North American Racing Team (NART) de Luigi Chinetti, uma das principais equipes particulares a correr com carros da Ferrari.

Não era de se esperar um resultado significativo. A Scuderia Ferrari tinha protótipos mais atualizados (os 330 P2) e mais rápidos para disputar contra poderosa equipe Ford com seus Gts 40 e MK IIs em um “duelo de gigantes”.

A 250 LM do NART era um protótipo mais antigo, para tentar sobreviver as 24hs e fazer, no máximo, uma boa colocação entre os 10 primeiros.

Para piorar, o colega de equipe de Rindt, o experiente piloto americano Masten Gregory, encosta logo no início da prova e perde um bom tempo no box, pois o V-12 Ferrari estava trabalhando só com 6 cilindros.

Rindt tira o macacão e arruma as malas par ir embora, sendo necessária toda a persuasão de Chinetti e de Gregory para que Rindt permaneça no circuito.

O jovem Rindt (23 anos) logo coloca suas condições: nada de poupar o carro de economizar os freios, etc – iria pisar fundo o tempo todo.

Assim ele e Gregory passam a pilotar as 24 hs andando no limite como se fosse uma corrida de 10 voltas.

Na manhã seguinte as Ferraris oficiais já tinham quebrado, assim como os Fords, e Rindt e Gregory, já em 2º lugar, perseguiam outra Ferrari 250 LM particular de uma equipe belga.

O chefe da Scuderia Ferrari, Eugenio Dragoni, tenta interceder junto às equipes particulares horrorizado com a perspectiva de ver as duas Ferraris sobreviventes se auto-eliminarem.

Mas nada segura Rindt. Ele segue em sua perseguição implacável à Ferrari irmã.

Finalmente a Ferrari belga (Dumay/Gosselin) estoura um pneu o que facilita a Ferrari do NART (Rindt/Gregory) tomar a ponta e vencer após 24 hs em ritmo de Grand Prix.

Nos esporte-protótipos Rindt faria ainda várias aparições ao longo dos anos sessenta com Ford GT 40 e principalmente com vários modelos Porsche (906/910/907/908).

Nos carros de turismo Rindt volta às origens em 1966 e pilota as Alfas GTA da Autodelta em poucas provas, como relatado acima, fazendo inesquecíveis aparições com os carros milaneses entre as quais lendária prova da Trans-Am em Sebring.

Durante a fase de agruras na F-1 essa vitória em Le Mans e suas aparições com as Alfas e com os protótipos Porsche seguraram o prestígio de Rindt no mundo automobilístico.

Mas endurance e turismo não eram as modalidades mais adequadas ao ímpeto de Rindt.

Foi nas curtas e rápidas provas de F-2 que ele se tornaria uma estrela com uma sequência de vitórias nunca igualada. Em 67 obtém 9 vitorias e no final de sua carreira teria um total, jamais igualado, de  25 vitorias na F2.

Na F-1, após o fim da temporada de 1967 ele se desliga da Cooper e dá o que parece ser um passo certeiro, assinando com a Brabham-Repco para 1968.

Mas a Brabham que tinha sido campeã em 66 e 67 com os motores Repco (blocos de alumínio V-8 Oldsmobile preparados pela Repco na Austrália), agora enfrentaria a formidável oposição dos V-8 Ford Cosworth, além dos motores próprios de Ferrari, Matra, BRM, Weslake, etc

Em 1968 a Repco apresenta um novo motor (desta vez sobre bloco próprio) que embora potente, perde toda a característica de robustez dos anteriores. O resultado para Rindt é uma série decepcionante de abandonos na temporada.

Do lado pessoal, o consolo de Rindt em 67/68 vem com os sucessos na F-2 e com o casamento com a “top model” finlandesa Nina Lincoln, cujo pai também fora um piloto de categorias menores.

Após a morte de Clark e Spence em 1968,  a Lotus faz uma oferta a Rindt para se juntar ao campeão mundial Graham Hill na temporada de 1969 ao volante do Lotus Ford 49-B

Em 69 ainda eram permitidos os aerofólios altos que acabaram causando perigosos acidentes a Hill e Rindt em Montjuic (GP da Espanha).

O final da temporada traria um outro grave acidente a Hill, mas Rindt vence finalmente seu primeiro GP na F-1 em Watkins Glen (EUA).

Em 1970 Rindt passa para a posição de primeiro piloto tendo a seu lado o britânico John Miles, sendo que Chapman vai adicionando à equipe novas promessas ao longo da temporada entre as quais o sueco Reine Wissel e um talentoso jovem brasileiro… um tal de Emerson Fittipaldi…

Em 1970 a Lotus faz a transição do Lotus 49 para o Lotus 72. Ambos foram carros revolucionários. O Lotus 49  embora com sua aparência clássica de “charutinho” dos anos 60 foi o primeiro monocoque curto em que o próprio motor fazia parte da estrutura de sustentação de todo o trem traseiro do veiculo. Já o Lotus 72 com sua frente em forma  de cunha e radiadores laterais, freios “inboard” e suspensão por barras de torção, marcou época e iria ditar a estética de todos os F-1 dos anos setenta, sendo um dos carros mais vitoriosos e longevos nos GPs (estaria nos GPs de 1970 a 1975 em diferentes versões).

Paralelamente, a Lotus propelida pela “fábrica de idéias” que era Colin Chapman, ainda deslancha na F-1 o projeto de um carro com quatro rodas motrizes (4x4), o Lotus 63, e adapta o Lotus Turbina (Lotus 56) já utilizado em Indianápolis em 1968, para os circuitos mais velozes de F-1.

Rindt prefere se concentrar no 49-C e no 72 (com tração traseira e um bom Ford Cosworth para empurrar).

Rindt vence com ambos (o 49-C e o 72) e os sucessos vêm em Mônaco, França, Holanda, Inglaterra e Alemanha. Algumas vitórias – finalmente- com alguma dose de sorte e outras por domínio absoluto, mas sempre com o enorme talento e a famosa combatividade de Rindt até o ultimo metro da última volta.

Embora 1970 viesse sendo uma temporada trágica para F-1 com a perda de Bruce Mclaren, Rindt fica particularmente abalado com a morte de seu amigo Piers Courage no GP da Holanda.

De qualquer modo, Rindt está literalmente com as “mãos na taça” quando chega a Monza para o GP da Itália e é reconhecido pelos próprios adversários como o virtual campeão mundial.

No treino do dia 5 de setembro de 1970 o Lotus 72 de Rindt está sem o aerofólio traseiro e os spoilers dianteiros pois ainda era hábito entre pilotos da época retirá-los completamente para ganhar mais velocidade nas longas retas de Monza.

Parece tudo normal. Durante o treino, antes da famosa curva parabólica que dá acesso à reta de chegada,  o Lotus 72 inexplicavelmente se desestabiliza em plena reta e se choca violentamente à esquerda no  guard-rail. Rindt morre imediatamente (embora as fontes oficiais declarem morte “na ambulância”).

Todas as Lotus são retiradas da prova e Colin Chapman ainda responderia por muito tempo a um processo na justiça italiana pela falha na construção do carro que teria levado ao acidente de Rindt.

Após a morte de Rindt, seu adversário mais próximo no campeonato, Jacky Ickx da Ferrari, ainda dependeria de uma remota conjugação de pontos e vitórias nas provas seguintes.

As aspirações de Ickx se tornam matematicamente impossíveis quando Emerson Fittipaldi obtém sua primeira vitória na F-1 no GP dos EUA em Watkins Glen com o Lotus 72..

Emerson dedica a vitória a Rindt, selando o destino do campeonato de 1970.

Terminada a temporada, em uma cena comovente na sede da FIA em Paris, Jackie Stewart e sua esposa Helen conduzem Nina Rindt à cerimônia de premiação que outorga o primeiro (e até o momento, único) título de F-1 “post mortem” a Jochen Rindt em justa homenagem ao grande campeão austríaco.

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