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Circuito da Gávea: 1937 - GP Cidade do Rio de Janeiro (Cap. 10)

• Por Alfa Romeo Clube do Brasil
Capítulo 10 do incrível artigo elaborado por Alberto Maurício Caló sobre o Circuito da Gávea.
Circuito da Gávea: 1937 - GP Cidade do Rio de Janeiro (Cap. 10)

CIRCUITO DA GÁVEA – 1937 - GP Cidade do Rio de Janeiro

(CAPÍTULO 10)                                                                      Por Alberto Maurício Caló


A PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR

Bem, as “flechas prateadas” foram uma absoluta sensação no mundo automobilístico, mas suas aparições foram seletivas. Esses carros não foram vendidos a pilotos particulares (ao contrário dos Alfas, Bugattis e Maseratis) e sua aparição dependia da disponibilidade das equipes oficiais da Mercedes e Auto Union e, é claro, esses carros só apareciam nas mãos dos pilotos e das equipes oficiais.

As aparições além de raras, muitas vezes estavam ligadas ao direito de um bônus adicional do governo alemão para determinadas provas (de maior grandeza) e não para outras. 

Isso fazia com que as vezes somente a Auto Union estivesse presente. Mas ocorreram casos inversos em que somente a Mercedes estava presente, principalmente em determinadas fases da temporada de 1935 em que o desenvolvimento e acerto dos carros da Auto Union estava problemático, fazendo com que somente a Mercedes estivesse presente.

Ver uma das “flechas prateadas” ao vivo não era para qualquer país ou para qualquer prova.

Essa seletividade na aparição criou uma “aura” indescritível no imaginário dos fans (ou fãs) de corrida de automóvel. E eram muitos porque todos gostavam de carros, queriam ter carros e a apreciação básica de uma corrida não dependia do conhecimento de regras complicadas. Era ver, gostar e aplaudir quem chegava na frente. Se fosse bem aventurado poderia ver as máquinas e os pilotos de perto.

Pilotos de corrida eram uma “raça” rara, super-homens ou semi-deuses que passavam 200Kms/h mereciam a admiração mesmo dos espectadores que nunca tinha visto uma corrida antes.


Onde foram vistas as Flechas Prateadas de 1934 a 1937?

Vamos analisar do início da aparição das flechas prateadas em 1934 até a prova da Gávea em junho de 1937.

Vamos notar que basicamente Mercedes e Auto Union participaram apenas dos eventos europeus, sempre no Grand Prix do país envolvido e mais raramente, provas de segunda grandeza desde essas fossem na Alemanha ou Itália, quando então, algumas vezes ia somente a Auto Union.

Quem recebeu essas provas entre 1934 e a Gávea de 1937 foram: 

- Itália na Coppa Acerbo (Circuito de Pescara)  no  GP de Milano (Parco Sempione) a Coppa Ciano (Circuito de Livorno ou “Miramare”) e o GP da Itália em si (circuito Monza na maioria das vezes mas ocasionalmente em Livorno).

- Alemanha (Circuitos de Avus e Nurburgring), 

- França (Circuito de Linas-Montlhery),  

- Espanha (Circuito de Lasarte em San Sebastian) e Penya Rhin (Circuito de Montjuic-Barcelona),

- Bélgica (Circuito de Spa-Francorchamps),

- Suíça (Circuito de Bremgarten - Berna), 

- Checoslováquia (Circuito de Brno), 

- Mônaco (Circuito de Montecarlo), e 

- Hungria (Circuito de Nepliget Park - Budapeste)

Sempre lembrando que isso era até o período que analisamos, ou seja, até a Gávea de 1937. Depois se acresceram outros circuitos.

Alguns desses grandes prêmios, de forma ainda mais seleta, formavam “campeonato Europeu”. No ano imediatamente anterior (1936) o campeonato fora formado apenas pelos GPs de Monaco, Suíça Alemanha e Itália sendo que o da Espanha (San Sebastian) não fora realizado devido à Guerra Civil Espanhola.


Algumas dessas provas eram precedidas de uma preliminar para motos e monopostos de baixa cilindrada “voiturettes”.


Exceções – OU aparições “excepcionais” das flechas prateadas

A únicas exceções a esse roteiro até junho de 1937 foram:

a)     subidas de montanha do campeonato alemão onde Mercedes e Auto Union compareciam com seus monopostos nos eventos do chamado “campeonato alemão de montanha” (realizadas na Alemanha ou subidas de montanha entre  Áustria e Alemanha);

b)    subidas de montanha fora desses países onde SOMENTE a Auto Union mandava seu especialista de subida de montanha Hans Stuck para os eventos “internacionais” europeus que seriam segundo nossa pesquisa Mont Ventoux e La Turbie (França), Stelvio (Itália) indo a primeira vez para a Inglaterra para a tradicionalíssima subida de Shelsley Walsh em 1936;

c)     Provas “coloniais” na Líbia e Tunísia:  Em 1935, 36 e 37 o GP da Libia (então colônia italiana) no ultra rápido Circuito de Mellaha em Tripoli (13,1 kms) onde um evento conjugado à loteria permitiu a arrecadação de fundos para a construção de tribunas e boxes e demais instalações em um padrão mais moderno que a grande maioria dos Circuitos Europeus. Normalmente antes ou depois da prova em Trípoli havia uma extensão para o GP da Tunísia (então protetorado francês) em 35 e 36 no Circuito de Cartago em Tunis – vide ilustração abaixo – notando-se que em  1935 só a Auto Union participou da prova contra os Alfas da Scuderia Ferrari;

d)    A África do Sul recebeu nas duas provas de handicap no começo de 1937, a saber o South  African GP em East London e o Grosvenor GP na Cidade do Cabo, mas essas eram provas de handicap com os carros largando um a um ( os mais potentes largando com minutos de atraso).

 

É necessário notar que nessas provas todas dos itens “a”, “b” e “c” acima, exceto as da Líbia e Tunísia as flechas prateadas NÃO se encontraram com seus principais rivais, a Scuderia Ferrari e seus Alfa Romeos, o que dá importância excepcional ao “encontro” da Gávea de 1937.

 

Conclusão sobre o padrão dessas aparições e a Gávea de 1937

Tirando as subidas de montanha onde apenas a Auto Union comparecia e essas duas provas de handicap na África, o Brasil foi o primeiro país do hemisfério sul e primeiro país das Américas ver uma “flecha prateada” em um GP propriamente dito.

E tirando as provas da Líbia e Tunísia foi a primeira vez que vimos as “Flechas prateadas versus Alfas da Scuderia Ferrari” com carros alinhados pelo tempo dos treinos e largando juntos como em um autêntico Grand Prix europeu. 

Uma deferência adicional foi o fato da prova da Gávea ter sido em meio à plena temporada européia quando o padrão europeu era sair da Europa antes ou depois de sua temporada local e nunca no meio delas Só o Brasil e depois do Brasil os EUA tiveram essa deferência.

A notar que os americanos só tiveram essa oportunidade quase um mês depois na Vanderbilt Cup de 1937 em 5/7/37, realizada após a prova brasileira e os ingleses mais no final do ano de 1937 no célebre GP de Donington Park em 2/10/37.

Como observação adicional, a Vanderbilt Cup de 1936 não contou com as equipes alemãs. E as provas de Donington em 37 embora tendo contado com Mercedes e Auto Union, não contaram com as Alfas oficiais da Scuderia Ferrari.

Repetindo, tirando as provas “coloniais” de Libia e Tunisia, a Gavea foi o primeiro confronto dos Alfas da Scuderia Ferrari contra uma das flechas prateadas nas Américas e no Hemisfério Sul antes mesmo do evento norte-americano.

PORQUE?

Vamos analisar porque o Brasil teve essa incrível deferência em termos das Américas ( como um todo) e Hemisfério Sul , sendo certo que o automobilismo brasileiro não era dos mais desenvolvidos e estava ”alguns degraus abaixo” não só do automobilismo norte americano mas também abaixo de alguns países do hemísfério sul, notadamente, Argentina, África do Sul e Austrália só para citar os mais óbvios A notar que países nórdicos que também tinham um automobilismo relativamente avançado também não viram as flechas prateadas contra os Alfas da Scuderia Ferrari.

Porque PINTACUDA e BRIVIO com as Alfas da Scuderia Ferrari?

A Scuderia Ferrari durante os anos trinta foi tanto o braço esportivo da Alfa Romeo, como foi em determinados momentos um braço “paralelo” da equipe própria, a “Alfa Corse”.

Em 1933 a Alfa Romeo já era tecnicamente uma estatal incorporada pelo “Instituto della Riconstruzione Industriale” (IRI) o que a fez passar as atividades esportivas para a Ferrari, porém em termos muito especiais e diferenciados de uma simples equipe com apoio de fábrica. 

Em determinados momentos era a Scuderia Ferrari que construía os carros de corrida Alfa Romeo e em outros havia uma “rivalidade paralela” entre Scuderia Ferrari e Alfa Corse com engenheiros e técnicos saindo de uma para se integrar à outra e vice versa. Ao longo desse período alguns carros de corrida foram construídos e correram pela Alfa Corse outros construídos e operados pela Scuderia Ferrari e outros repassados da primeira para a segunda.

Vários detalhes do que estamos falando são tratados nas biografias de Enzo Ferrari, ou na história da “Scuderia” e um dos melhores estudos está na biografia de Ferrari feita pelo celebre jornalista americano Brock Yates.


Foto emblemática do poderio da Scuderia Ferrari no início dos anos 30 com um “batalhão” de Alfas P3.

A Scuderia Ferrari já tinha se apresentado no Brasil em 1936 com Carlo Pintacuda e Attilio Marinoni. Não sabendo o que os esperava e talvez na expectativa de algo mais tosco como uma prova de estrada, os dois foram despachados com carros esportivos bipostos bastante atualizados, as magnificas Alfas 2900 A “botticella”, sem faróis e para-lamas que podiam enfrentar terrenos mais rudes como os das provas de estrada italianas entre as quais a famosa “Mille Miglia” que esse modelo ganhara naquele mesmo ano.

Tudo isso foi viabilizado por um vantajoso acordo para a Ferrari através do qual o empresário Comendador Sabbado D`Angelo (do qual vamos falar a seguir) interveio para pagar todas as despesas e presumivelmente a verba de aparição (ou o “prêmio de largada”) sem o que a Scuderia não teria saído da Europa.

Tratados como grandes estrelas em 1936 por um público e imprensa literalmente aos seus pés, os italianos se defrontaram com uma oposição limitada com carros mais antigos e só não venceram as duas provas (GP do Rio de Janeiro ou a Gávea de 1936 e GP de São Paulo) porque as Alfas quebraram no Rio onde Pintacuda se encaminhava para uma vitória quase certa. Depois ganharam com toda facilidade em São Paulo onde famosamente Pintacuda se deu ao luxo de fumar um cigarro com tranquilidade em uma parada de box.

Em São Paulo, cientes de sua superioridade, Pintacuda e Marinoni, foram obrigados a largar na última fila por um detalhe de regulamento na formação do grid e o fizeram sem maiores discussões, tamanha era a vantagem que os ases italianos tinham sobre seus concorrentes.

No ano seguinte, em vista apenas da prova da Gávea e sabendo mais exatamente o que os esperava, Ferrari mandou suas estrelas ascendentes Brívio e Pintacuda, com verdadeiros monopostos que estavam sendo correntemente utilizados nas provas européias.

Os italianos estavam cientes da presença de Stuck com ao Auto Union e que outros concorrentes estavam bem melhor preparados entre os quais o excelente piloto-cliente argentino Carlos Arzani que fora comprar na Itália uma Alfa 8C 35 e fizera uma prova de teste na Itália mostrando sua inegável habilidade, sem contar que outro argentino Ricardo Carú estava com uma das “Alfas 2.900 A” utilizada pela Ferrari no ano anterior (carro que em seguida foi vencedor do GP de Buenos Aires de 1936 com Carlos Arzani).

Preliminarmente precisamos explicar que Pintacuda e Brívio estavam sendo tratados pela Scuderia Ferrari como os “astros emergentes” do automobilismo italiano assim como Farina, Villoresi, Marinoni, Biondetti, Siena e Severi. além dos sócios de Enzo Ferrari na Scuderia o Conde Carlo Felice Trossi e Mario Tadini, ambos também pilotos talentosos.

O astro inconteste da Ferrari era Tazio Nuvolari que porém estava em plena temporada européia e era ali necessário porque o “Maestro” era então o único piloto e único italiano a conseguir derrotar as flechas prateadas em um confronto direto.

Nuvolari era um profissional propriamente dito e seu acordo com Ferrari era diferente dos outros pilotos que eram todos o que poderíamos chamar mais propriamente de “semi-profissionais”.

Dentro do conceito “divide et impera”, Ferrari queria encontrar novos astros entre os jovens pilotos italianos ou europeus para não depender unicamente do “Maestro”.

Em 1934 os Alfas da Scuderia Ferrari foram apresentados por experientes pilotos estrangeiros (o monegasco Louis Chiron e o novo astro francês Guy Moll) e pelo “às” italiano Achille Varzi. 

Mas Varzi aceitou o convite da Auto Union em 1935. O astro “ascendente” Guy Moll infelizmente faleceu em um acidente e o novo “ás” francês Raymond Sommer insistia em se manter independente de equipes oficiais e, de certo modo, parecia incoerente para os italianos não ter um primeiro piloto italiano liderando a Scuderia.  

Ferrari, então, teve que obter a benção da Alfa e juntar recursos para trazer novamente Nuvolari, que, em 1934, estava atuando de forma independente normalmente ao volante de Bugattis e Maseratis. 

Obviamente Nuvolari não só era contratado em bases profissionais mas elas eram totalmente diferenciadas, conquanto vários outros pilotos corriam pela “Scuderia” sem qualquer despesa paga e com base apenas em porcentagem dos prêmios de resultado (os prêmios de largada eram uma “receita financeira” da Scuderia).


Magnífico cartaz do célebre ilustrador Georges Hamel (Geo Ham) para o GP de Mõnaco de 1936 ilustrando um Auto Union seguido de um Alfa ou (flexas prateadas x Alfas da Scuderia Ferrari)- Justamente o “Clássico” europeu nos Grand Prix que viria para a Gávea de 1937.

Mas Ferrari, grande observador de pilotos, entre 1934 e 1935, notou os jovens pilotos italianos que se destacavam, entre seus clientes (caso de Pintacuda) ou “ex-clientes” em outras equipes caso de Giuseppe “Nino” Farina se destacando ao volante dos Maseratis da “Scuderia Subalpina” e Antonio “Tonino” Brivio que já tinha tido passagens pela Alfa como piloto de carros esporte, mas que vinha ultimamente atuando em Grand Prix como piloto oficial da Bugatti.

Pintacuda, Brivio e Farina eram - todos os três - de famílias abonadas e juntaram a isso bravura e talento para a pilotagem. Assim sendo, e pela época que viveram na Itália, era inevitável que parte de suas carreiras tivessem evoluído em torno dos belos e velozes carros esportivos da Alfa Romeo.

Todos eles e outros mais eram candidatos a ser o “segundo piloto” preferencial da Scuderia Ferrari e a eles se juntavam eventuais sócios da Scuderia como o Conde Carlo Felice Trossi e Mário Tadini eles mesmos bons pilotos e outras estrelas italianas como Villoresi, Tadini, Marinoni, Biondetti, Siena e Severi e alguns pilotos estrangeiros (como os franceses Raymond Sommer e René Dreyfus) que vez por outra apareciam nos carros da Scuderia.

Hoje é muito fácil concluir que a grande estrela que emergiu dessa “peneira” foi Giuseppe “Nino” Farina, que assumiria o lugar de primeiro piloto nos Alfas da Scuderia Ferrari quando Nuvolari foi correr pela Auto Union e continuou ligado à Alfa no pós guerra para ser o primeiro campeão mundial de F-1 com uma Alfetta 158 da equipe oficial, a Alfa Corse.

No entanto, precisamente em 1937, esse lugar de “segundo piloto” era disputado principalmente por Brívio, Pintacuda e Farina.

Quando Ferrari mandou Pintacuda e Brivio para o Brasil, para prova da Gávea de 1937, podemos vislumbrar que Ferrari considerava Farina mais importante na Europa para compor a equipe principal com Nuvolari e também devemos considerar que Nuvolari notoriamente dava mais atenção a Farina como seu eventual “herdeiro”. Então Nuvolari e Farina ficaram na Europa e depois participaram da Vanderbilt Cup nos EUA.

E de fato, no interregno da excursão ao Brasil, Nuvolari e Farina representaram a Scuderia nos eventos internacionais com eventual auxilio do Conde Trossi e do “às” francês Raymond Sommer.

Vamos falar mais tarde sobre os carros, pois Brivio veio com uma Alfa 12C 36 e Pintacuda com uma 8C 35 o que daria talvez uma noção de “hierarquia”, mas também é indicio de uma tática de equipe de “dividir forças”.

Sempre lembrando que praticamente todos os Alfas P3 da Scuderia já tinham sido vendidos até o início de 1936. A Scuderia começaria a temporada de 36 com a 8C 35 acrescendo a 12 C 36 no GP de Tripoli em 10/5/36.  

De fato a 8C 35  e a 12 C 36 estrearam nas pistas com cerca de 10 meses de diferença ( setembro de 35 a primeira e maio de 36 a segunda) e tinham basicamente o mesmo chassis. O 12 cilindros tinha apenas 20 a 30 HP a mais que o 8 cilindros, mas era mais pesado e um motor menos provado que o lendário e constantemente desenvolvido 8 cilindros “em linha” da Alfa. O 12 C não era tão confiável e sabidamente tinha uma regulagem caprichosa (coisa que seria averiguada na prova da Gávea de 1937 como veremos a seguir). 

Depois vamos citar uma ocasião em que o grande Nuvolari, na opção de substituir outro piloto em prova, teria preferido ficar com o 8C 35 ao invés do 12 C 36.

De forma geral, Brivio era visto com mais frequência nas 12 C 36 enquanto Pintacuda era visto com mais frequência nas 8C 35. 

Na maioria das provas em que os dois modelos estavam disponíveis a Scuderia corria com ambos. Em 1936 em algumas ocasiões como o GP da Hungria em 21/6/36 daquele ano, a Scuderia levou apenas os 8C 35 e obteve uma arrebatadora vitória de Nuvolari contra as equipes alemãs. Eventualmente para provas italianas menores a 2.900 A “biposto” aparecia junto das 8 C 35 e 12C 36.

 Mas em 1937 quando a Ferrari já tinha as 12C 36 em quantidade, levava a 8C 35 como “reserva” naquela altura (meados de 37) a Scuderia já estava vendendo a 8C 35 a pilotos particulares.

Tudo isso leva a crer que Pintacuda, inscrito na Gávea de 1937 com a 8C 35 tivesse um “status” levemente inferior ao de Brivio como piloto de monopostos de Grand Prix embora fosse certo que ambos fossem considerados no mesmo nível em termos de provas para carros esporte.

Além disso, cremos embora talvez houvesse uma hierarquia na Europa, na América do Sul o tratamento seria igualitário pela equipe inclusive porque Pintacuda era o piloto já “experiente” na Gávea enquanto Brívio que faria sua primeira aparição no Brasil.

Já no tratamento da imprensa e público brasileiro, Pintacuda foi obviamente mais prestigiado devido à sua ótima participação na Gávea de 1936 e sua vitória no GP de São Paulo logo em seguida.

Apenas para repetir uma informação, o muito aguardado carro da Alfa para 1937, a Alfa 12 C 37 somente iria aparecer no final da temporada na Coppa Acerbo em Pescara em 15/8/37 estreando como já falamos nas mãos de Nuvolari e Farina, mas inscritos pela equipe de fábrica “Alfa Corse” e não pela Scuderia Ferrari.

Nuvolari decepcionado com a 12 C 37 faria uma apresentação isolada com a Auto Union na Suica. 

A ainda problemática 12C 37 se tornara quase um “nati morto” pois o regulamento das corridas de Grand Prix iria mudar para 1938. 

No final, a corroborar esse nascimento infeliz, a Scuderia Ferrari preferiu se apresentar com as 12 C 36 no GP da Itália em Livorno, com Nuvolari, Farina, Trossi, Belmondo e Biondetti e, constrangedoramente, uma única 12 C 37 foi inscrita pela Alfa Corse e ainda assim não nas mãos de um piloto habitual, mas sim nas mãos de seu lendário piloto-chefe de testes Giambattista Guidotti.

Nesse GP da Itália em setembro surgiu um desentendimento que trouxe uma luz sobre o assunto. A Alfa Romeo tinha comprado o controle acionário da Scuderia Ferrari, mas as duas se inscreveram como equipes independentes. Como citamos acima, a Alfa Corse levou uma 12C 37 para seu piloto de testes Guidotti para “salvar as honras” do novo modelo. Já a Scuderia Ferrari levou as habituais Alfas 12C 36 para Nuvolari, Belmondo, Farina e Trossi e uma 8C 35 para Biondetti, este último, teoricamente, o piloto-reserva da equipe. Houve um desentendimento entre Brivio e o chefe de equipe Luigi Bazzi durante os treinos pois Bazzi determinara que quem competiria seria o piloto reserva de Brivio, Clemente Biondetti. Nesse momento Brivio teria contrastado Bazzi com um suposto contrato no qual estaria dito que ele Brivio era o segundo piloto de Nuvolari e, portanto, teria preferência de largar e não poderia ser substituído por Biondetti e ainda por cima teria preferência também em escolher o carro, que sabemos teria preferido a 12C 36. 

Não se sabe o detalhe do contrato ao certo, mas no domingo da corrida, Brivio assistiu a prova como espectador ao lado de sua esposa e Biondetti correu com uma 12C 36 como todos os outros pilotos da Scuderia. Também não temos notícia da eventual intervenção do outro diretor esportivo da Scuderia o depois célebre “ Maestro” Nello Ugolini.

Isso nos traz a idéia de que Brivio se sentia segundo piloto, mas que para Enzo Ferrari o segundo piloto de Nuvolari era uma vaga “em aberto” que, conforme os resultados da última corrida” poderia ser de Brivio, Pintacuda, Farina ou Trossi sem distinção. Em outras palavras “segundo piloto é quem foi melhor no último fim de semana” (um raciocínio típico de Enzo Ferrari).

Ainda em 1937 a Scuderia apareceria no Circuito Brno-Thecoslováquia com Nuvolari e Brivio sempre nas 12C 36.

Concluindo, a Scuderia Ferrari, embora sem Nuvolari, trouxe para a Gávea dois de seus melhores pilotos “emergentes”, Pintacuda e Brivio, com dois carros que estava usando correntemente nos GPs europeus de 1937 (Alfa 8C 35 e 12C 36).

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